domingo, 26 de novembro de 2017

É preciso ser homem para libertar-se do machismo

A França lançou uma campanha nacional para mudar a cultura machista, profunda e resistente aos avanços históricos.

O projeto ataca em duas frentes: a educação e a lei. 

Seguindo estes caminhos pretende-se cercar o problema no âmbito jurídico e ético. 

Não há formas mais eficazes de alterar a mentalidade social. A conduta humana deve ser pensada no campo da filosofia prática e de seu derrame nas pedagogias junto ao aporte das ciências psicológicas e sociais. Por ouro lado, o ordenamento jurídico estabelece os parâmetros criminais vetando aquilo que a moral prescreve, por vezes proíbe, mas não pode punir. 

Políticas públicas e afirmativas são necessárias para equalizar as relações de gênero quebrando a barreira das identidades e dos papeis sem descaracterizar os sexos e suas diferenças. A promoção da igualdade significa respeito às distinções ao realizar a equivalência de oportunidades e de tratamento. 

Simone de Beauvoir
Ações deste porte e com esta intenção são libertárias.

O "eu" masculino e o "eu" feminino reconhecem-se no "outro" que é o sexo oposto, porém, sem jamais estarem reduzidos ao poder que submete, à força que nega direitos em nome de uma cultura de gênero que, se corretamente questionada, se desnaturaliza e revela-se artificial e injusta.

"Os indivíduos que se opõem às opiniões recebidas têm sido a fonte de todo o progresso, tanto moral quanto intelectual." B. Russell

Parte-se da realidade para transformar a própria realidade, o que se mostra necessidade ontológica humana: não somos os mesmos desde sempre.  

"O poder-ser é sempre um poder-ser a partir de certa facticidade, de certa situação." W. Luijpen.  

É preciso ser homem como fato para libertar-se do machismo ativo da cultura. 
É preciso ser mulher para libertar-se da passividade opressiva. 

Enquanto projeto, o ser humano é existência consciente no mundo, presente e para o qual a realidade significa. Sem ser resultado somente de forças determinantes, o ser humano é livre para escolher caminhos mais éticos e justos, portanto. 

Como sociedade que projeta seu futuro nesta direção, a França mostra-se comprometida com a história tanto do país quanto do mundo procurando alterar percursos até agora equivocados, apesar de todas as ideologias e lutas pela igualdade de gênero já produzidas.

Se ninguém nasce mulher, mas torna-se mulher, como diz Simone de Beauvoir, o mesmo ocorre com o homem: ambos nascem macho e fêmea, nada mais. O modo como vão se autoconstruir reproduzindo culturas ou modificando-as, aqui no caso voltadas ao gênero, é parte do projeto pessoal e coletivo, do poder-ser, livre. 

Não há liberdade sem libertação. 

"O homem se realiza, mas isso só significa realmente alguma coisa quando o homem luta por desfazer o peso de uma facticidade que escraviza sua liberdade." Luijpen


Por Charles Dalberto
Imagens: rfi, bioblog




sábado, 25 de novembro de 2017

Ao lado de alguém

O amor é antes de tudo uma virtude.

Aquela que consuma todas as outras: quem ama não precisa da moral.

"Máxima do dever: age como se amasses." André Comte-Sponville

Contudo, o amor não é um sentimento simples, nem simples é sua compreensão e prática.

Distinguem-se três modos de amar.

A primeira forma toma o amor por paixão, pathos. O amor é eros, desejo e carência. Se não desejássemos algo, não o amaríamos. E se o temos cessando o desejo, já não o amamos mais. É preciso que haja a carência ou o temor da ausência para que se continue desejando e seduzindo astutamente para enfim possuir o amado.

Amar é também reciprocidade, encontro entre amantes. Um jeito de amar que é philia, amizade e estima. Ama-se quem corresponde e troca gentilezas, respeito, lealdade, carinho, cumplicidade. Se não há equivalência recíproca no trânsito do sentimento, há desencontro. Amar, assim, sustenta-se pelo intercâmbio fundamentado no sentir.

Ama-se ainda com total desinteresse, apenas por amar, incondicionalmente. É o amor ágape, santo pelo sua absoluta generosidade. O outro não é amado por ser importante, mas se torna importante porque é amado. Só deuses amariam assim, mas há ensaios autênticos entre humanos, como na maternidade emocionalmente sadia.

Amor na falta, egoísta.
Amor no encontro, recíproco.
Amor solitário, porém que se basta, altruísta.

Os relacionamentos misturam em medidas variáveis conforme o caráter e a situação, os três tipos abraçados pelo conceito de amor.


Na predominância de um sobre o outro é que se julga o grau de valor do amor que se está vivendo ao lado de alguém.


Cuándo vale la pena luchar por amor?

Por Charles Dalberto
Imagens: Aleteia, Mitologia e Fantasia



sexta-feira, 24 de novembro de 2017

Conexão natural

"O homem de bem é um atleta que se compraz em combater nu; despreza todos os ornamentos vãos, que dificultam o emprego de suas forças e cuja maior parte só foi inventada para esconder uma deformidade qualquer." J.J. Rousseau.

Já no Discurso sobre as ciências e as artes, escrito em 1750 e que trouxe popularidade ao filósofo genebrino, ele oferecia à Academia de Dijon seu pensamento que coloca em oposição natureza e cultura, physis e nómos.

Ao demonstrar ao longo de sua obra filosófica o afastamento humano de sua essência pelos processos civilizatórios, Rousseau propõe o retorno a ela como percurso para a felicidade que passa pela superação das paixões que contradizem o fundamental: o homem é um sujeito natural, livre e solidário.

A civilização salva-se ao voltar-se à natureza.

Por Charles Dalberto
imagem: uol

Felicidade tóxica