quarta-feira, 21 de março de 2018

Se somente a repressão funcionasse

Escutemos o passado.

Há um grito por liberdade que reverbera por todos os espaços sociais oprimidos do Brasil.

Situemos um ponto: 13 de maio de 1888.

Cais do Valongo, RJ - Debret
Neste dia o Brasil considerava ilegal a propriedade sobre outro ser humano. Consideremos aqui o negro escravizado além do Atlântico, feito cativo num complexo mercado que envolvia conterrâneos do continente africano e europeus economicamente interessados na escravidão.

A abolição da escravidão no Brasil, tardia e pouco planejada, a não ser para favorecer a elite rural com mão de obra barata, resultou de mudanças nas relações comerciais brasileiras com a Inglaterra e ainda outros mercados necessitados de consumo e, portanto, de homens assalariados.

Contudo, tornar livres os cativos não significou inclui-los na economicamente sociedade, nem resultou em esforços do estado em benefício desta população. Suas carências sociais como saúde, saneamento urbano, moradia, escolarização, transporte, lazer e tudo o que depende da renda não foi conquistado, nem supridos em serviços públicos.

No dia 13 de maio de 1888, com a Lei Áurea, o Estado deixou de reconhecer o direito de propriedade de uma pessoa sobre outra. Contudo, isso não significou que todas as relações de trabalho nas sociedades regidas pelo capital passariam a ser guiadas por regras de compra e venda da força de trabalho mediante assalariamento, com remuneração suficiente para a manutenção do trabalhador e de sua família. Leonardo Sakamoto, Cientista Político, USP. 

A marginalização constituiu o berçário de problemas incomensuráveis para o Brasil de hoje.

Exército nas ruas do RJ
O descontrole do estado sobre a violência urbana no Rio de Janeiro, mesmo com a intervenção militar, sugere uma interpretação mais adiante do uso das forças armadas na repressão ao crime.

O crime organizado é negócio.

O mercado de drogas, de produtos do roubo e do furto, sejam eles quais forem, o comércio de serviços e de artigos clandestinos e tudo o que gera lucro à margem da legalidade produz riqueza e compete com a formalidade. Dispensa a burocracia e exerce o direito pela força, uma vez que não dispõe de instituições.

O crime organizado gera renda ao ocupar quem não tem condições ou interesse ou não pretende pertencer à sociedade institucionalizada ou ainda respeitá-la, pois o crime infiltra-se em todas as instâncias.

Reprimir, apenas, o crime organizado não significa eliminar suas raízes.

Mais do que estrangular o fluxo de mercadorias e capital sufocando o negócio, seria preciso tornar o crime organizado uma atividade sem atratividade ou razão de ser por falta de contingente humano.

Aquela demanda necessária desde as origens da pobreza no Brasil: levar o estado e as oportunidades de prosperidade à universalidade da nação. O crime não pode ser alternativa para gerar renda, nem deve haver sensação de impunidade para seus participantes em qualquer posição que se encontrem.

Os governos querem realmente acabar com o crime organizado ou apenas mantê-lo sob controle?

Sem o crime organizado, qual a alternativa de trabalho que a sociedade oferece para quem enriquece ou sustenta-se com ele?

A pobreza e o crime seriam formas mais sofisticadas de escravidão?

Quem ocupa altas posições sociais e pertence às organizações criminosas possui maior grau de responsabilidade pela situação da qual se aproveita?

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imagens: Mauro PImentel AFP
Repórter Brasil

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