O parlamento espanhol coloca em debate o reconhecimento dos animais como sujeitos.
A proposta de lei pretende elevá-los da condição de objetos para conferir a eles subjetividade fundamentada-a na vida senciente. Os animais possuem uma forma complexa de consciência e ao reconhecê-la assume-se o respeito à dignidade animal de viver uma existência coerente com sua natureza.
Para muitas pessoas isto já é um valor praticado e alguns países já estão à frente na questão. Outras sociedades possuem códigos de proteção aos animais domésticos e selvagens, porém sem a particularidade essencial de uma mudança de status ontológico dos animais.
Como o direito positivo é humano, ele incorpora na forma da lei a proteção dos animais por meio dos seus direitos convencionados pelo processo cultural. No Brasil, por exemplo, o artigo 32 da lei 9605/98 que versa sobre o meio-ambiente, proíbe o abuso, os maus-tratos, ferimentos, mutilações, práticas dolorosas ou crueis, seja para fins didáticos ou científicos injustificados com pena de até 1 ano de prisão e multa.
Mudar a condição ontológica, porém, significa que os animais deixam de ser propriedade dos donos que passam a ser entendidos como tutores dos mesmos e de seus direitos. Isto pode significar a promoção deles quando estariam eclipsados, como exigir mais liberdade para animais até então cativos por desejo dos donos.
A Espanha avança na direção que transforma a cultura ocidental que por séculos manteve incomunicáveis humanos e animais quando a abordagem de ambos implicava em tratamento dos primeiros sobre os segundos sob o princípio da igualdade.
No que humanos e animais são iguais?
Uma das mais eloquentes vozes do campo da ética, o utilitarista australiano Peter Singer, aponta a sensação de dor e prazer, consagrada desde Epicuro na filosofia, como substrato a ser considerado quando se pensa na ação humana envolvendo os animais.
"Os animais são capazes de sentir dor. Como já vimos, não pode existir qualquer justificação moral para considerar a dor (ou o prazer) que os animais sentem como menos importante do que a mesma dor (ou prazer) sentida pelos humanos." Peter Singer, Libertação animal
Encarada como histórica no país por entidades envolvidas com o direito dos animais, e global pela consequência e repercussão, a lei prova a consciência moral no trato para com os bichos porque faz uma exigência à sociedade: um animal não mais será visto como coisa, tratado como coisa, mas como uma individualidade dotada de características tais que se respeitadas e liberadas para serem vividas, significam oportunizar ao animal uma vida feliz segundo sua natureza.
E que natureza é esta a ser entendida sem ter que entrar em discussões metafísicas?
A de ser o animal um ser dotado de sensibilidade e alguma consciência evidente. Assim como o ser humano, o animal possui interesse inviolável inferido pelo ser humano e por ele respeitado: o de não sofrer.
"Se um ser sofre, não pode haver justificação moral para recusar ter em conta esse sofrimento. Independentemente da natureza do ser, o princípio da igualdade exige que ao seu sofrimento seja dada tanta consideração como ao sofrimento semelhante - na medida em que é possível estabelecer uma comparação aproximada - de um outro ser qualquer." Idem.
A proposta moral e legal pretende acelerar a humanização da relação entre humanos e animais sem impor a conversão dos animais em humanos, o que seria uma aberração jurídica e dos costumes. Não é, portanto, impedir o homem de dispor dos animais, mas sim alterar a forma da relação pautando-a em valores morais os quais a lei vem resguardar o cumprimento.
Tratar as diferentes espécies e seus respectivos interesses com equivalente respeito ao dado aos interesses humanos configura a igualdade já afirmada pela ONU na Declaração Universal dos Direitos do Animais.
Por ley, en España los animales dejarían de ser considerados cosas
Por Charles Dalberto
Imagens: Current Affairs, PxHere
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