sábado, 12 de maio de 2018

Assassinos da História

Os crimes de Estado são essencialmente contraditórios: é o Estado quem delimita a legalidade por meio do direito e ele próprio viola deliberadamente este limite.

Sendo o Estado a instância máxima e soberana de uma sociedade constituída, uma vez que ele seja o agente do crime, recorrer ao próprio Estado fica comprometido.

Não se pode buscar legitimidade na ilegitimidade, justiça na injustiça, direito no não-direito.

Um Estado criminoso esvazia-se da função e niiliza qualquer pretensão de justiça.

Dawn Rothe, especialista no tema, descreve o crime de Estado como

"Qualquer ação que viole o direito internacional público, e/ou uma lei doméstica do próprio Estado quando tais ações são praticadas por atores individuais agindo em favor ou em nome do Estado, mesmo quando tais atos sejam motivados pelos seus interesses pessoais econômicos, políticos e ideológicos." 

Dos crimes de Estado, os mais graves e que historicamente provocam não somente os maiores traumas como também expõem a repetitiva prática de abuso do poder da violência, prerrogativa exclusiva dos Estados modernos, mas limitada ao direito positivo, estão o genocídio e as violações aos direitos humanos.

Ao analisar os crimes de Estado, o professor José Carlos Moreira da Silva Filho afirma que

"É o Estado que tem se revelado o principal autor dos crimes contra a humanidade. E isto traz um agravante, pois é justamente o Estado quem deveria proteger os seus cidadãos da violação dos seus direitos fundamentais."

À sociedade ferida pelos abusos despóticos do Estado confere-se o direito de conhecer os atos criminosos praticados por seus governos e por meio de instrumentos institucionais, como a justiça de transição, buscar a reparação, bem como exigir que tais ações não se repitam salvaguardando princípios universais em favor do direito humano.

"Justiça de transição é um termo de origem recente, mas que pretende indicar aspectos que passaram a ser cruciais a partir das grandes guerras mundiais deflagradas no Século XX: o direito à verdade e à memória, a reparação, a justiça e o fortalecimento das instituições democráticas. O foco preferencial da justiça de transição recai sobre sociedades políticas que emergiram de um regime de força para um regime democrático, mas também pode ser claramente identificado dentro dos próprios regimes democráticos, sempre que ocorrerem violações de direitos humanos pelo Estado." Ibidem. 

A sociedade brasileira, na sua diversidade, compõe-se de indivíduos e grupos frequentemente violados pelo Estado.

Agora ela toma conhecimento de que o Ernesto Geisel, quando presidente (1974 - 1979) no regime da ditadura iniciada em 1964, ordenou as mortes sumárias e fora do rito judicial de presos políticos considerados subversivos, muitos enquadrados como terroristas com base na Lei de Segurança Nacional. A confirmação coloca no nome do general entre os assassinos políticos da História.


O documento divulgado pelo Departamento de Estado do Estados Unidos é recebido com ressentimentos profundos devido às cicatrizes recentes da ditadura e, provavelmente, pela crise democrática que o Brasil atravessa e a reivindicação, por parte da população, de uma intervenção militar golpista contra o Estado Democrático de Direito, desconsiderando as experiências históricas negativas, a abusividade absoluta do ato e a arbitrariedade dos regimes de exceção.

"Ao serviço do Estado estão aparelhos repressivos fortemente treinados e armados, como as polícias e as forças militares. Na estruturação destes aparelhos se apresenta uma organização burocrática com várias e complexas ramificações, um conjunto ideológico que justifica as suas ações, um forte sentimento corporativo e uma racionalidade instrumental que perpassa todas as suas instâncias. Nenhuma quadrilha ou bando de criminosos de um país consegue igualar tal poderio" Ibidem

Há justificativa para um Estado tornar-se criminoso?
Que esperanças de reparação as vítimas da ditadura Geisel podem ter se confirmadas as arbitrariedades do executivo?

Existirá justiça já que há entendimento de que os crimes de Estado contra a humanidade não prescrevem?


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